sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Amor filial

REGRESSO AO LAR

Ai, há quantos anos que eu parti chorando
Deste meu saudoso, carinhoso lar!...
Foi há vinte?...há trinta? Nem eu sei já quando!...
Minha velha ama, que me estás fitando,
Canta-me cantigas para eu me lembrar!...

Dei a volta ao mundo, dei a volta à Vida...
Só achei enganos, decepções, pesar...
Oh! a ingénua alma tão desiludida!...
Minha velha ama, com a voz dorida,
Canta-me cantigas de me adormentar!...

Como antigamente, no regaço amado,
(Venho morto, morto!...) deixa-me deitar!
Ai, o teu menino como está mudado!
Minha velha ama, como está mudado!
Canta-lhe cantigas de dormir, sonhar!...
(Guerra Junqueiro)

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Individualização


Para o psicanalista C. G. Jung, nascido na Suiça em 1875, todas as pessoas passam por um processo de individualização; entretanto, as que têm consciência do mesmo podem considerar-se afortunadas. Por individualidade entende-se a nossa singularidade última, incomparável, que faz de cada habitante do Planeta, um SER ÚNICO. Na harmonia da Natureza, cada vegetal ou mineral, cada animal tem a sua função, a sua utilidade. Como no dizer do famoso químico francês Lavoisier: "na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma..."A consciência da própria identidade coloca o ser humano numa comunhão indissolúvel com o Mundo, numa sintonia de funcionamento e criatividade. O mais interessante neste crescer constante é que, para se tornar único e fazer brilhar a sua singularidade, o Homem precisa de todos os outros: familiares, amigos ou desconhecidos e mesmo daqueles que já não vivem. Ninguem é auto- suficiente, de forma que nos completamos, nos consolamos e nos ajudamos mutuamente e assim crescemos todos os dias como indivíduos e como grupo. Muitas vezes ponho-me a pensar nessa aventura maravilhosa que é viver e compreender o mecanismo da existência. Olhar o mundo com os "olhos de ver" e descobrir sempre mais. A paz que tanto almejamos começa no nosso íntimo, contagia o nosso semelhante e transforma o ambiente em que vivemos. Podemos decidir agora, por vivências de trabalho e realização ou por permanecer numa atitude de cristalização de "vícios" psicológicos, a fomentar guerras e conflitos. Com esta crónica venho saudar todos os meus leitores e desejar que a felicidade seja sempre a meta de cada um em particular e de todos em geral...

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

A "Aculturação" dos Filhos



É mais do que legítima a aspiração dos pais desejarem o melhor do mundo para os seus filhos; mas como as crianças são, por norma, influenciadas por aquilo que vêem fazer em casa, se nesse espaço iniciático não existirem hábitos de leitura, dificilmente eles trilharão esse caminho no futuro. Há pais que se esforçam até ao limite das suas capacidades económicas para que os seus filhos tirem um curso superior, só que muito raramente levam um jornal ou um livro para casa, não frequentam museus ou bibliotecas com a família e quando sintonizam a televisão é para visionarem somente programas desportivos ou de puro entretenimento, alguns deles de péssima qualidade. Muitas das crianças e adolescentes, com problemas de aprendizagem nas escolas e notas de baixo nível, cujos pais os trazem para as minhas consultas de psicoterapia, confessam que em suas casas não são motivados para a leitura, que estudam muito pouco, sendo de concluir que essa desmotivação está quase sempre directamente ligada ao desinteresse cultural dos seus progenitores, a quem nunca viram empenhados em aumentar os seus próprios conhecimentos. Um curso superior não se consegue apenas por um «passe de mágica», ou seja porque os pais que já alcançaram uma certa estabilidde económica desejam atingir através dos filhos a concretização de um sonho que ambicionavam para si, e que jamais realizaram, devido a múltiplos factores. Porque para que esse curso aconteça, não basta o dinheiro que se investe na escola estatal, ou, então, por facilitismo, no colégio particular ou na universidade privada, sendo necessário que os pais se esforcem por desenvolver os seus hábitos de leitura e a sua cultura geral, de forma a estarem preparados para acompanhar os filhos ao longo do seu percurso académico. Pois caso contrário, essas crianças dificilmente atingirão a tão sonhada licenciatura, ao serem educadas num ambiente «aculturado», sem ideias nem motivação.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Serenidade

O Amor



O amor é o sentimento por excelência e está na base de toda estrutura psicológica saudável. Amar-se a si mesmo é a principal necessidade do ser humano e amar ao próximo é a consequência directa dessa atitude. Para abordar algumas questões ligadas a este tema recorro ao conceituado psicanalista alemão, naturalizado americano, Erich Fromm, autor do livro "A Arte de Amar". O autor nos alerta para este facto: «o amor não é um sentimento a que qualquer um possa se entregar, independentemente do seu grau de maturidade...é uma atitude, uma orientação do carácter, que determina a relação de uma pessoa com o mundo em geral e não apenas com o "objecto" do amor...» O primeiro aspecto a considerar nessa matéria é que o amor próprio (auto-estima) é o ponto de partida para viver outras fomas de amor. Só dá Amor aquele que o possui. Para amar o próximo é preciso amar-se a si mesmo. O Amor é uma energia que se expande na medida em que é vivido na forma de dar e receber. Assim como as actividades físicas e intelectuais são passíveis de treino para se desenvolver, a actividade afectiva do ser humano pode e deve ser exercitada para um crescimento harmonioso do Homem e da Sociedade. Uma pessoa que queira avançar em termos afectivos deve começar a olhar para si de maneira terna e carinhosa, cuidar do seu corpo que é a morada da sua alma. A sua casa deve ser limpa e bem cuidada para sentir-se bem, dentro dela. Para se amar a si mesma uma pessoa deve trabalhar muito mas também proporcionar-se momentos de lazer e de crescimento cultural e espiritual. Erich Fromm fala-nos de diversas formas de amor: filial, materno, paterno, romântico, erótico, fraterno, religioso ,místico, etc... São várias dimensões e expressões do mesmo Amor que emana do interior de cada ser humano. Por isso é preciso fazer silêncio para escutar a voz que vem de dentro do coração. Com esses cuidados você vai tornar-se uma pessoa melhor, pois enquanto as emoções negativas aprisionam e fazem sofrer, o amor liberta, revigora e dá saúde porque é a fonte de sanidade.

Olhares



A cantora brasileira Maria Bethânia declama num dos seus discos o excerto de um poema muito bonito de Fernando Pessoa que diz assim: «Como as coisas são engraçadas/quando a gente as tem nas mãos/e olha devagar para elas». Quantas vezes você já olhou, terna e calmamente, para uma criança adolescente ou adulto deficiente mental?
Quantas vezes você já olhou para uma pessoa com deficiência sem pena, sem expectativas, só e tão somente para conhecê-la? Para auscultar-lhe o espírito, sem esperar nada dela; somente para comunicar com ela através do olhar? Olhar para as pessoas deficientes tem constituído grande parte do meu trabalho nos últimos anos. Na verdade, temos de ser muito persistentes e passarmos por muitas experiências frustrantes, se quisermos ter algum êxito numa tal missão. Mas, pensando bem, o que haverá no interior daquele cérebro danificado? Será que um cérebro danificado, um sistema nervoso comprometido é suficiente para destruir o espírito do homem ou mulher? Digo-vos que não. Certamente que não. Através do olhar, de um olhar profundo de amor podemos ultrapassar as barreiras neurológicas e orgânicas que separam a pessoa deficiente mental do nosso mundo de pessoas ditas "normais". Foi sempre através de um olhar calmo e prolongado que fiz muitas descobertas sobre o mundo interior do deficiente mental e sobre as minhas próprias deficiências. Foi através do olhar que descobri lucidez, mesmo em pessoas portadoras de deficiência mental profunda. Não encontro palavras que consigam descrever a minha alegria em detectar naqueles corpos afectados, uma réstia de luz, de ternura, de afecto, de vida e mesmo de tristeza por tantos e tantos anos de isolamento e de solidão.eu tenho-os olhado, incansavelmente, à procura deles mesmos, como uma jóia preciosa que vale a pena conhecer e convido-vos a todos vocês, leitores amigos, que me acompanham neste trabalho de descoberta, de múltiplos olhares, não só de pessoas deficientes, mas de todas as pessoas, cujas vidas e os seus problemas, constituem a principal razão de ser, e de existir, deste blogue. Pois como canta a Amélia Muge numa das suas mais belas canções: «Todos os dias nasce uma pessoa». E só por isso vale a pena viver e lutar!...

Psicoterapia

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